O discurso reconhecido como autobiográfico na obra de Marguerite Duras (1914-1996) decorre de que suas narrativas, geralmente em primeira pessoa, permitem, em diferentes representações do “eu”, que a identificação da narradora/personagem seja assimilável ao sujeito empírico. Os frequentes elementos lidos como biográficos, presentes nos seus textos, entre memórias e confissões íntimas, são facilmente reconhecidos pelos leitores familiarizados com a escrita de Marguerite Duras, tanto pela recorrência em suas diferentes publicações, quanto por informações de cunho extraliterário. O objetivo deste trabalho é propor algumas considerações sobre a dimensão ética que se manifesta na voz autoral dos últimos livros de Marguerite Duras publicados ainda em vida: La Pluie d’été (1990), L’Amant de la Chine du Nord (1991), Yann Andréa Steiner (1992), Écrire (1993), Le Monde Extérieur (1993) e C’est tout (1995). Nestes textos, as narrativas sobre si mesma evidenciam a encenação da própria escrita, produzidas quando é latente a proximidade da sua morte em virtude da idade avançada e do agravamento de doenças. A dimensão ética da voz autoral, por sua vez, é abordada pelo desejo de transparência da linguagem manifesto na “escrita sobre o processo de escrita”, voltando-se para um almejado grau zero (BARTHES, 2004; 2012; BLANCHOT, 2005; SISCAR, 2010). Dessa maneira, a escrita de Marguerite Duras permite uma abordagem em que sejam contrapostos os conceitos de autorepresentação (PATERSON, 1982; FOUCAULT, 2001) e de autoficção (OUELLETTE-MICHALSKA, 2007; VILAIN, 2009). Assim, ao ocuparem-se da própria ação de escrever, as narrativas de Duras vislumbrariam, na reflexão sobre a própria linguagem, possibilidades de expressarem sua transparência, portanto sua sinceridade, pela linguagem.