Dois intelectuais negros no Brasil do século XIX evidenciam, em suas trajetórias, as preocupações com o contexto sócio-histórico-cultural com que se defrontavam ao buscar um espaço de legitimação para os seus escritos. Luiz Gama, de um lado, constrangido pelos limites de uma sociedade escravagista e monárquica, e Cruz e Sousa, de outro, pela dinâmica de ascensão da Primeira República e pela elevação a estatuto de ciência das ideias racistas. Conhecidos cada qual, na historiografia, por papéis distintos: o primeiro, como um grande abolicionista e o segundo, como o grande poeta do fim do século, o percurso de ambos demonstra como são móveis as fronteiras entre os campos da cultura no Oitocentos brasileiro. Confundindo política e literatura, arte e protesto, parte da obra de cada um desses intelectuais focaliza a questão do “negro” na sociedade de capitalismo atrasado do século XIX e coloca as estratégias de resistência cultural às ideologias hegemônicas de construção de nacionalidade.