Nos últimos cinco anos, um fenômeno tem se manifestado no mercado editorial português: o lançamento sistemático de livros que reconstituem a presença dos colonizadores daquele país em territórios africanos, durante a segunda metade do século XX. Nesses títulos, o leitor encontra uma miríade de memórias da vida cotidiana que os portugueses levavam em Angola e Moçambique naquele tempo, além de reconstruções literárias do retorno emergencial a Lisboa que os colonizadores foram obrigados a fazer no período entre a Revolução dos Cravos, em 25 de Abril de 1974, e as declarações de independência das ex-colônias, que se sucederam até fins de 1975. Livros como Caderno de memórias coloniais (2009), de Isabela Figueiredo, e O retorno (2001), de Dulce Maria Cardoso, que se encaixam nesse novo nicho editorial, tematizam a questão da perda abrupta de bens, familiares e amigos, ao mesmo tempo em que trazem à tona continuidades advindas do período colonial. Entre essas últimas, estão a construção e manutenção da hierarquia do colonizador perante o colonizado e a constante desqualificação moral e física desses indivíduos negros nativos. Os livros também evidenciam a posição ambivalente do colonizador português, que ora atua como algoz e ora é retratado como vítima das circunstâncias. Tais títulos têm vindo à tona às vésperas da efeméride de 40 anos da Revolução dos Cravos e em meio a um cenário de grave crise econômica, o que faz pensar num momento catártico propício para tal revisão do processo colonial. São narrativas que transitam entre a ficção e a não-ficção escritas por filhos de colonos portugueses que foram crianças de cerca de dez anos à época do retorno forçado e que, portanto, parecem, hoje, se sentir mais à vontade para empreender tal tarefa. A análise dessas narrativas de retornados portugueses, entendida sob os vieses da perda colonial e da exploração do colonizado, integra a pesquisa Retornados à África: Novas narrativas sobre a colonização portuguesa no século XX, que resultará na tese de doutorado a ser defendida no Programa de Pós-Graduação em Literatura, Cultura e Contemporaneidade do Departamento de Letras da PUC-Rio, sob orientação da professora doutora Eneida Leal Cunha.