O capítulo pretende refletir sobre relações de gênero e interculturalidade a partir da obra El nombre prestado, da escritora paraguaia Susana Gertopán. A narrativa em análise possibilita apreender a representação literária a partir do ponto de vista de uma autora feminina, descendente de judeus que imigraram para a América Latina, especialmente para Argentina e Paraguai, no período da Segunda Guerra Mundial. Após sobreviverem ao holocausto, os homens e as mulheres retratados por Gertopán necessitam recompor suas identidades, fragmentadas entre o desejo de se manterem fiéis à tradição judaica e à necessidade de interagir com o Outro. A escrita de autoria feminina, na América Latina, é marcada por uma trajetória de opressão e de negação à voz feminina. E como o que “não está escrito não existe” (NAVARRO, 1995, p. 13), o silenciamento imposto à mulher fez com que, por um longo período, ela se mantivesse a margem dos importantes momentos históricos vividos em solo latino americano. Na década de 80 do século XX, vozes femininas inscrevem-se na história da Literatura a partir de textos engajados, que discutem política e grandes dramas humanos. Trata-se de textos que denunciam a ditadura de diferentes países latinos, que “rompem a regra do silêncio imposto à mulher e desafiam, portanto, a construção social tradicional do sujeito feminino” (NAVARRO, 1995, p. 14). Após citar os trabalhos de Isabel Allende, Nélida Piñon, Eva Luna e Gioconda Belli, Navarro lembra que ao escrever seus romances, as escritoras fixam sua forma de encarar os fatos que marcam a história. São textos críticos, políticos e reveladores, mas marcados pela voz feminina e por tudo aquilo que é caro a essa voz. Nesse sentido, As seis narrativas de Susana Gertopán, ainda não traduzidas para a Língua Portuguesa, adotam a estrutura de um texto memorialístico: uma personagem, já de idade avançada, rememora a fuga do holocausto e a luta para encontrar uma identidade que a defina. El nombre prestado (2000), segunda narrativa de Gertopán, não é diferente. Nela, pai e filho são responsáveis por revisitar o passado. O narrador-protagonista, que na narrativa é o filho, traduz a angustia de não conseguir seguir a tradição judaica pregada por seu pai e, ao mesmo tempo, descortina ao leitor a fragilidade de seu pai frente à necessidade de interagir que uma cultura que não é a sua. Assim, a personagem Iósele, José, que depois passa a se chamar Alejandro, enquanto narra suas lembranças, apresenta as demais personagens e os conflitos que movimentam o enredo, dentre eles estão: a incompatibilidade de ideias entre ele e o pai; a angústia do pai em preservar a língua e os costumes judaicos e o sentimento de não pertencimento de ambos. O sujeito da diáspora necessita, portanto, se descontruir, para, por fim, reconstruir-se em um novo território.