Entre os anos de 1908 e 1913, o contista uruguaio Horacio Quiroga (sob o pseudônimo S. Fragoso Lima) realizou experimentações em outro gênero narrativo, através da escritura de seis novelas de folhetim que foram publicadas nas revistas ilustradas Caras y Caretas e Fray Mocho. Para que se compreenda a totalidade destas novelas, se faz necessário ir além de sua estética e de sua matriz narrativa particular, levantando questões que dizem respeito a problemáticas sociais e ideológicas encontradas nas primeiras décadas do século XX em uma Buenos Aires em rápida transformação. Amparados pela perspectiva teórica de Ángel Rama, Antonio Cândido, Beatriz Sarlo, Eduardo Romano e Umberto Eco, compreendemos que as novelas quiroguianas, sendo produtos da indústria cultural, pertencem a um território de contestação, um lugar intermediário entre a literatura da tradição e a cultura popular. Ademais, reconhecer que a circulação e consumo destas novelas deu-se em especial nas camadas médias da sociedade portenha – formada principalmente por imigrantes espanhóis e italianos - nos obriga a refletir sobre a existência de uma comunidade literária que não correspondia às expectativas da elite letrada. Aqui justamente reside o valor destas obras: são testemunhas do apocalipse que ocorre quando a literatura deixa de ser um reino reservado para os espíritos superiores que a compreendam e começa a sofrer uma irrevogável aproximação com o público.