A partir da leitura de vários textos sobre teoria e prática da tradução (Benjamin, Campos, Britto, Paes, Vizioli) compreende-se que a tradução não deve ser literal, presa à palavra, à sintaxe, mas fiel ao sentido amplo da obra, às suas intenções e tensões. Como pesquisadora da obra de María de Zayas y Sotomayor, uma das raríssimas autoras do Século de Ouro Espanhol, percebo que suas coletâneas de contos –Novelas amorosas y ejemplares (1637) e Desengaños amorosos (1647)- têm uma tripla intencionalidade: alterar e reinterpretar obras canônicas de modo a favorecer a representação das mulheres; contestar os discursos que depreciavam as mulheres; e autorizar a escrita feita por uma mulher. Seus engenhosos contos emoldurados estabelecem um intenso diálogo com o leitor, ora implícito, no nível da composição literária, ora explícito, no nível do discurso. Os contos unem prosa e verso, como era comum no período, e inovam ao combinar traços de diferentes gêneros literários em cada narrativa. A primeira coletânea tem um modus operandi distinto da segunda, porém, ambas congregam-se em um fim político: provar que as mulheres têm virtudes e os homens, vícios. Pergunta-se: a leitura da analista pode guiar a atividade da tradutora? Como, em uma tradução, transpor essa riqueza de elementos compositivos, de desdobramentos de sentido? Este artigo pretende contribuir com o objetivo geral do simpósio e dialogar com outros pesquisadores sobre os desafios da tradução de textos literários do Século de Ouro ao expor reflexões, escolhas, problemas e inquietações na tradução de um conto: Aventurarse perdiendo.