A literatura hispano-americana tem sido insistentemente pensada a partir de uma estereotipada identidade nacional, processo que teve início no século XIX, por ocasião gradual independência das colônias, e ratificada pelo boom dos anos de 1960 quando se apresentou a denúncia de problemas sociais, através da crítica política e do estilo experimental de narração. O que se observa, no entanto, é que a narrativa atual se constrói a partir de um perfil bastante heterogêneo, na medida em que parecem cair as escolas ou agremiações literárias em favor da pluralidade de linguagens e de perspectivas. Ela permite-se visitar um gênero massivo, como o policial, flertar com o cinema, colocar na berlinda a separação entre o ficcional e o biográfico. Nesse sentido, tem sido recorrente o debate sobre conflitos internos de alguns países, colocando o narrador e as personagens diante da guerra e do depois da guerra. Entender o massacre, a dor, as mutilações e a tortura do passado, é também um narrar sobre si mesmo e alguns autores não hesitam em entregar sua própria história ao público. Estabelece-se uma curiosa simbiose entre o ficcional e não ficcional, ambos dramatizados, contudo. Esta comunicação, pois, discute, inicialmente, se o contemporâneo – ou o pós-boom como é chamada, com alguma resistência, a literatura hispano-americana a partir dos anos de 1990 – realmente suplanta o boom ou se remastiga, como forma de processo, o passado, inclusive literário, para então investigar e sentir o presente. A literatura contemporânea, portanto, não estaria fechada em um momento, estabelecendo uma periodização estética e sim aberta para um ontem mais próximo do que o porvir ou do que “está”. Questiona-se, também, o que a narrativa nos diz da literatura contemporânea, fartamente conceituada como fragmentada, líquida, globalizada, como se alguma vez o homem houvesse sido inteiro ou um fugitivo do devir. Para fomentar essas reflexões, detemo-nos nos temas da memória e da subjetividade em relação à violência nas obras El olvido que seremos, do colombiano Héctor Abad Faciolince, e La hora azul, do peruano Alonso Cueto. Nelas, percebe-se que os narradores não se voltam necessariamente para um agora fechado, compreensível para o leitor do ponto de vista de poder-se caracterizá-lo em categorias, mas a um presente em curso porque nele está o homem incompleto e necessitado de voltar-se para o que está soterrado para então seguir em frente. Este tema faz parte da pesquisa Violência e subjetividade na narrativa latino-americana contemporânea, do PPGL – Mestrado em Letras da Universidade de Santa Cruz do Sul/Brasil.