O tema do amor é questão privilegiada em diversos campos do saber, principalmente no mito, na filosofia e na literatura, fazendo parte de um debate milenar, conforme conferimos em O banquete de Platão. Em textos canônicos ou não, este tema se tornou lugar comum no espaço literário, porém, enquanto na visão clássica vem acompanhado de uma perspectiva aurática, na visão moderna, por se constituir no palco da sociedade do “mal estar”, parece fadado à ruína. Conforme aponta Bauman em Amor líquido (BAUMAN, 2004), falar da situação amorosa hoje é linha de força em alta, no entanto, o herói das histórias contemporâneas é complexo, pois, enquanto traço representativo do sujeito inserido na sociedade moderna, não se deixa antever facilmente, pois as relações afetivas são virtuais e, colocam em crise o mito do amor, os relacionamentos atuais parecem feitos sob medida para o líquido cenário da vida moderna. Assim sendo, o intuito deste trabalho é discutir a temática do amor no romance contemporâneo, tomando como objeto de estudo uma personagem do romance As horas nuas de Lygia Fagundes Telles. O romance narra a busca da personagem, Rosa Ambrósio que, a partir da memória, tenta reconstruir sua trajetória de vida, avaliando seu comportamento amoroso, observando onde errou e onde acertou, com o propósito claro de descobrir porque naquele momento de sua vida se encontra tão solitária. A mulher empreende uma busca implacável impulsionada por desejos individuais num mundo de relações afetivas caóticas, ou como sujeito inserido em um mundo degradado, o que parece configurar uma falta de sintonia entre amantes e por que não dizer entre homem e mundo (cf. LUKÁCS, 2000) ao referir-se ao herói moderno ou problemático. Para tanto, abordaremos dois relacionamentos amorosos da personagem, para entender como se dá a materialização e dissolução do amor, suas vicissitudes e incompletudes. Observamos que, na obra de Lygia as relações amorosas aparecem, em sua grande maioria, como suporte de autoconhecimento humano, ou seja, depois da desilusão o homem tem um encontro com ele mesmo e cria, a partir disso uma “teia de relacionamentos interpessoais” (LAMAS, 2002, p. 111). Concluímos, portanto, que há de alguma maneira uma fragmentação amorosa declarada no romance contemporâneo, uma recorrência na troca de parceiros, que sugere uma busca constante por uma completude utópica. O sujeito amoroso tende a enxergar o outro como seu todo (cf. BARTHES, 2007), sem entender que o paradigma da contemporaneidade é a dissolução amorosa, o amor problemático, decorrentes da hostilidade causada pela individualidade do sujeito.