A comunicação versará sobre a experiência do escritor argentino Tulio Carella no Recife, na década de 60 do século passado, segundo seu diário publicado sob o título Orgia – diário primeiro. Nesta obra, aspectos ficcionais revestem o registro do autor de sua temporada brasileira, como professor de teatro e, sobretudo, como estrangeiro que (re)descobre numa terra exótica um frenesi erótico homossexual. Sob o nome de Lucio Ginarte, Carella descreve seu flanar pelas ruas do Recife, os múltiplos encontros com homens majoritariamente pobres, negros ou mestiços e as considerações sobre o Brasil como uma “África com as vantagens do Ocidente”. Seu relato proporciona uma reflexão da sexualidade como um discurso desviado sobre a nação, a partir das problematizações que o texto cria entre identidades nacionais (e latino-americanas) e a homossexualidade como uma rasura no tecido em que o nacional se constrói. O discurso de Carella põe em evidência também a fragilidade do construto heterossexual, do qual ele não se exclui, e as complexas relações de poder entre homens negros e brancos; neste caso, metaforiza o sexo com homens pobres e negros como uma dádiva oferecida pelo homem branco. Conclui-se que o texto de Tulio Carella coloca uma perspectiva para se refletir sobre o estatuto da heteronormatividade reprodutiva da nação como arbitrária e provisória, ao mesmo tempo em que dilui, involuntariamente, o discurso sobre o homem heterossexual brasileiro e o lugar da homossexualidade. O trabalho se apoia nas contribuições teóricas de Homi Bhabha (1998), Avtar Brah (2006), Gayatri C. Spivak (2010) e José Quiroga (2010).