Na contemporaneidade, é visível certa recorrência de narrativas que revelam uma escrita pretensamente autoficcional. Segundo Barbosa (2008), a autoficção é uma criação literária que não tem obrigação com a verdade como a autobiografia, podendo, assim, misturar realidade e ficção. Partindo dessas considerações, objetivamos, nesse trabalho analisar o conto “Lixo e Purpurina”, de Caio Fernando Abreu, integrante da obra Ovelhas negras (1975), atentando para os elementos que revelam a relação entre autor e personagem, ficção e realidade, entre outros aspectos que envolvem a escrita de si, além de buscar identificar traços representativos da condição de exilado, de estranho/estrangeiro vivido pela personagem protagonista do conto. Sob esta ótica, nos basearemos teoricamente nos pressupostos de Bakhtin (2003) sobre a relação autor e personagem, Barbosa (2008) sobre autoficção, Freud (1996) em relação ao conceito de estranho, Viñar (1992) sobre a temática do exílio, entre outros autores. Na leitura de “Lixo e Purpurina”, constatamos que o autor resgata suas memórias fazendo uso de uma técnica narrativa em que a confluência de categorias como realidade e ficção, vida e arte constituem linha de força de sua escrita. Na construção da estrutura narrativa, é notável a representação de um sujeito que experimenta a condição de exilado, de estranho/estrangeiro, a ferramenta para a configuração do jogo entre ficção e história, haja vista a experiência do escritor na condição de exilado vivida na Europa durante a Ditadura Militar.