LITERATURA, CULTURA E NAÇÃO: MODULAÇÕES E TRANSGRESSÕES NOS ACORDES DE MÁRIO DE ANDRADE Beatriz Lopes (UnB)Resumo:Nas décadas iniciais do século XX, no espaço-tempo em que as tendências ocorrem em simultaneidades, as confluências e as disjunções do pensamento oitocentista sobre cultura e nacionalidade adentram as ideias de modernidade, a modernização e os avanços tecnológicos, as efervescências socioculturais das cidades e, juntamente com o advento do Modernismo, ensejam diferentes formas de socialização e interação entre os intelectuais, as camadas populares e suas manifestações artísticas. A cultura ganha centralidade nos debates sobre o projeto de construção de uma identidade brasileira, de valorização do nacional e do popular. Nessa vertente, a literatura, a música e as artes plásticas, produtos e produtoras de cultura, vão mediar a sustentação desses ideais, através de um projeto estético de renovação das artes e de um projeto político de emancipação pela cultura. Assim, problematizando as concepções de cultura brasileira, de identidade nacional, de arte erudita e popular, de folclore, de tradição e modernidade, de interação artística, de língua nacional, em formulações que atravessam e diluem os limites temporais e conceituais, em suas aproximações e distanciamentos, as produções artísticas de Mário de Andrade e sua atuação como intelectual da cultura fazem emergir uma narrativa socioestética de nação que ora se integra, em movimento de continuidade e complementaridade, com o pensamento social brasileiro ainda vigente na época, apontando a cultura como um espaço privilegiado onde se processa a tomada de consciência do que nos falta; ora subverte as fronteiras culturais e promove a ruptura com a visão civilizatória europeia, contrapondo a autenticidade e a autoafirmação de nossa singularidade. Então, a cultura associada à questão nacional elege a nação como reflexão cultural, categoria que encobre as diferenças de classes e elabora uma ideologia unificadora que tenta cauterizar as feridas no fosso entre as elites e o povo. Nesse sentido, Mário de Andrade terá um papel de convergência no quadro combinatório entre cultura e nação, tanto na literatura quanto na música, na mediada em que promove uma transversalidade com os ideários de identidade brasileira, conformando em sua trajetória e produção artísticas um processo civilizador pela cultura, como intelectual, musicólogo, escritor, crítico de arte, desempenhando a tarefa de mediador simbólico, isto é, a expressão da memória nacional, atuando como agente intermediário das duas dimensões o popular (plural) e o nacional na construção da identidade brasileira. E sua obra Macunaíma torna-se a formulação mais acabada da convergência de projeto estético e de projeto ideológico do Modernismo e se converte em paradigma de seu pensamento sobre cultura e em espaço poético-musical imaginário e “desgeograficado”, que a literatura inventa e ocupa, rompendo barreiras da linguagem oficializada, incorporando a força ampliadora e libertadora do folclore e da cultura popular e vinculando a vocação do artista e do intelectual aos destinos da nacionalidade, expandindo-se, como utopia, para além dos âmbitos literários e artísticos, nos principais movimentos culturais ao longo do século XX.Palavras-chave: Literatura, Cultura, Nação, Mário de Andrade.