Avesso aos clichês do brasileiro típico e eterno viajante, como habitualmente declara em entrevistas, o autor contemporâneo Bernardo Carvalho costuma ambientar seus romances nos mais improváveis e diversificados cenários. Da Mongólia ao Japão, passando pela Rússia, é quase sempre em solo estrangeiro que seus personagens vivem, transitam e relacionam-se. Mesmo quando em terras brasileiras, o estranhamento quanto à ambientação se sustenta: ora é a imagem da urbana e cosmopolita São Paulo a ser reverenciada, ora o exílio no coração de uma isolada tribo indígena do Amazonas a surgir como paisagem eleita. Estereótipos como o do país tropical, violento, povoado por mulheres de sensualidade exacerbada, malandros e amantes de samba e futebol passam longe da prosa itinerante do autor. A partir dessa constatação, este trabalho tem como objetivo discutir a recepção crítica da obra ficcional de Bernardo Carvalho na França a partir de 1997, ano da publicação naquele país de Aberração (Aberration, Rivages). Calorosamente acolhidas pela crítica francesa, as traduções dessa coletânea de contos e dos romances Os bêbados e os sonâmbulos (Les ivrognes et les somnambules, Rivages, 1998), As iniciais (Les initiales, Rivages, 2002), Nove noites (Neuf nuits, Métailié, 2005), Mongólia (Mongolia, Métailié, 2004), O sol se põe em São Paulo (Le soleil se couche à São Paulo, Métailié, 2008) e O filho da mãe (‘Ta mère, Métailié, 2010) suscitam uma reflexão a respeito da imagem da literatura brasileira contemporânea no exterior. Pautada desde sempre nos clichês brasileiros, estaria ela sofrendo uma mudança de paradigma desde a última década?