O presente artigo vislumbra enfatizar o liame existente entre Direito e Literatura. Partindo-se do pressuposto que ambas são Ciências Humanas, na qual seu objeto de estudo são as relações interpessoais, constata-se como a Literatura é uma importante fonte hermenêutica para a exegese jurídica. A partir da interpretação do enredo de “A hora da estrela”, escrito por Clarice Lispector, faz-se uma análise de todo o contexto social e jurídico vivenciado pelas mulheres, ontem e hoje. Dessa maneira, pretende-se extrair o retrato, feito pela autora, da mulher daquela época (no caso, a protagonista Macabéa) e de todas as relações que a rodeavam, como seu relacionamento com Olímpico de Jesus, seu namorado, e, principalmente, sua visão de si como mulher. A partir da leitura do enredo modernista, sopesou-se o cenário da vivência retratada por Lispector, com a própria realidade do cotidiano feminino. Assim, analisou-se o papel da mulher na evolução das codificações civis, por meio de comparações entre os códigos de 1916 e 2002, dando ênfase à relação das mulheres no tocante a sua conjuntura familiar e sua presença perante a sociedade. Ademais, torna-se evidente essa interface entre a alegoria criada por Lispector e a realidade sociocultural das mulheres daquele período, notadamente expresso nas letras da lei. Por essa razão, fez-se mister a sondagem das lutas feministas e dos reflexos que essas tiveram no âmbito jurídico. Dessa forma, a realidade, quando observada com um olhar crítico e consciente de toda a trajetória de luta e autodeterminação feminina, se torna mais compreensível e, vale dizer, mais humana e galgando significativos degraus rumo à igualdade material entre os gêneros.