É de ampla notoriedade no âmbito intelectual e artístico-literário brasileiro, marcado pela desigualdade de gênero, que o espaço de autoria feminina, e mais especificamente das produções literárias nordestinas, continua configurado no estreito da margem. Este texto, que emerge de uma pesquisa mais ampla (em curso), surgiu a partir do interesse em fazer repercutir a produção literária de escritoras nordestinas da transição do século XIX para o XX, particularmente, cearenses e ainda mais: interioranas, como por exemplo Emília Freitas, Ana Facó, Serafina Pontes, Ana Nogueira, Úrsula Garcia, Adília Luna de Freitas, Alba Valdez, Maria da Câmara Bormann e Francisca Clotilde, quase todas com obras fora de circulação, há décadas sem edição, expostas ao “memoricídio”, que segundo a escritora Constância Lima, se trata do apagamento/esquecimento da sua escrita e seus nomes. Nessa perspectiva, apresentaremos aqui, um recorte que pode servir como mostra de um ato de resistência, aceno de inscritura e inscrição num lugar de fala: trata-se da poesia de Francisca Clotilde (Tauá - CE, 1864), vanguardista ao problematizar temáticas consideradas tabus para a época. Trabalharemos os sonetos Vésper (1915), Mistérios (1915), Lágrimas (1916), A garça (1918) e Andorinha (1920), neles, sob o viés do sentimentalismo confessional, um eu-lírico nos dá conta da inquietude de não ter “liberdade”, logo, privado do arbítrio e desautorizado a inscrever-se na cena pública e na disputa por voz no jogo social. A análise buscada é de cunho interdisciplinar/intercultural. Nos auxiliam na abordagem: a Análise do Discurso, a Teoria da Representação Social, Teoria Crítica e a Crítica Pós-Colonial.