Em sua última conferência sobre a sexualidade feminina, em 1932, Sigmund Freud reafirma a premissa de que a maternidade seria a única saída possível à feminilidade, fazendo equivaler o ser mulher e o ser mãe. A partir da atual posição subjetiva em que as mulheres se encontram, onde a maternidade não mais se configura como um destino social, este artigo busca interrogar o que a psicanálise pode dizer hoje sobre a mãe, procurando discutir e apontar uma leitura mais apropriada da feminilidade e da maternidade articuladas às vertentes de desejo e de gozo. Para tanto, utilizamos como ferramenta de análise o livro A filha perdida, da escritora italiana Elena Ferrante. Nele, a autora dá forma a uma concepção curiosa da maternidade em que o amor de mãe é completamente desnaturalizado e problematizado, operando, a partir da leitura do romance e da articulação possível entre a psicanálise e o texto literário, um deslocamento da idealização da mulher toda-mãe para a mulher não-toda.