Conceição Evaristo estreou na literatura nos anos 90 construindo um longo percurso de escrita sobre a realidade afro-brasileira, com a inevitável representação da violência que atinge esses corpos. A violência nas obras de Evaristo vem através do desvelamento da pobreza, racismo, machismo, sexismo, violência de gênero, violência estrutural, violência religiosa. Em grande parte da sua literatura a evidência está nas relações de gênero existentes na sociedade, sobretudo sobre a mulher negra, escolha temática que aborda o peso duplo da violência sobre o corpo dessa mulher (DJAMILA, 2017). Os escritos de Evaristo mudam a lógica de protagonismo na literatura, majoritariamente branca e masculina, para uma literatura de autoria e protagonismo negro, percebido no título dos seus contos, como acontece em Maria, Olhos D'Água (2014), objeto de análise deste trabalho, mulher negra, pobre e mãe-solo. A descrição da violência aparece diretamente relacionada a realidade da população negra com a construção de um cenário em que os personagens são tão marginalizados e violentados no dia a dia que, embrutecidos, chegam também a violar os seus. Carrega, apesar disso, especial poética, envolvendo o leitor na brutalidade da ficção-realidade de forma ritmada, entre o passado e o presente, como espécie de fuga, devaneio, poesia, brincando e ressignificando as palavras. A violência apresenta-se também na escolha dos termos que indicam como essa violência se enuncia e apresenta a mulher negra. Cabendo reflexão sobre como esse lugar emudece a mulher. E, por fim, a importância da produção em questão, enquanto rompimento ao padronizado como produção literária válida dentro do campo literário, entendido como um espaço de poder (BORDIEU, 1996).