Narrar uma situação traumática nem sempre é um processo fácil. Muitas memórias dolorosas são deixadas no esquecimento por medo ou vergonha. Dessa forma, experiências envolvendo abusos sexuais na infância ou adolescência ficam por muitas vezes no silêncio, o que impede inclusive que a denúncia seja feita. É exatamente essa situação vivida por Una, na graphic novel autobiográfica Desconstruindo Una. Na obra, a personagem passa por abusos sexuais na infância e vive um processo de trauma causado pela culpabilização da vítima, o que a impede por anos de contar o que aconteceu. O presente artigo analisou como a memória traumática da personagem foi representada na HQ e como essa narrativa possibilitou que ela falasse sobre essa violência, apresentando o potencial dos quadrinhos para criar uma ponte de diálogo sobre o tema “cultura do estupro” e o público infanto-juvenil. Foi possível identificar, através da metodologia proposta por Luiz Motta (2013) na obra Análise Crítica da Narrativa, como as representações gráficas e a reconstrução das fases vividas pela personagem foram capazes de auxiliar nesse debate acerca do abuso infantil e dos impactos que o silenciamento das vítimas pode causar inclusive na saúde mental delas. As HQ’s possuem um potencial imagético que conseguem alcançar diversas faixas etárias e níveis de conhecimento, o que as tornam potenciais ferramentas para introduzir discussões sobre temas como assédio, estupro e violência contra mulheres.