Considerando as Crônicas de Índias como documentos literários relevantes para o estudo das relações entre História e Literatura, tem-se como objetivo principal neste trabalho a análise dos fatores ideológicos presentes na Crónica del Perú (1550), obra escrita por Pedro de Cieza de León, em relação aos aspectos utópicos de uma realidade cristianizada no Novo Mundo. A fim de contrariar o suposto juízo imparcial presente na obra defendido por Yrigoyen (2005, p. 09), associado ao caráter descritivo das crônicas, tem-se como ponto de partida as relações entre utopia e ideologia propostas por Hilário Franco (1992), o conceito de utopia por Thomas More (1516), bem como a interpretação deste último por Quiroga (1535), para a construção de uma análise da manifestação do comportamento dos pueblos descrito na obra e o movimento de constante cristianização do Novo Mundo. Neste movimento, encontramos presente uma ideologia que “se impõe pela repressão das demais” (JR., 1992, p. 12), ou seja, um cristianismo imposto numa sociedade que não possui fundamentos cristãos, como os ideais de céu e inferno, anjos e demônios, ou até mesmo a noção de Deus. Sendo assim, a utopia, essencialmente coletiva, está na busca por uma salvação coletiva dos índios através dos movimentos cristãos e “inevitáveis batalhas”, dado que o Novo Mundo deveria, nesta perspectiva, seguir os fundamentos do reino católico de Espanha, relatados na Crónica del Perú, que reúne memórias descritivas de terras e povos que compõem uma utopia da cristianização.