O processo de construção identitária de sujeitos “desviantes” ou “ilegítimos” (termos comuns para designar aqueles que fogem da normatização imposta pela matriz heterossexual) envolve a experienciação de eventos psicobiológicos singulares e, concomitantemente, discursivos, erigidos pelo corpo social, em dado tempo e espaço. Com base nessas reflexões, temos o intento de demonstrar como a arte literária mimetiza as ideologias sociais, como suas representações tornam visíveis as sanções e interdições impostas a indivíduos assumidamente homossexuais. Nosso arcabouço teórico compreende as teorizações de Michel Foucault, em sua História da Sexualidade (2011), os estudos de Eve Kosofsky Sedgwick (2004). Temos, aqui, uma base epistemológica capaz de nos fornecer os subsídios capazes de sustentar uma análise discursiva da sexualidade. Para atingir os objetivos, debruçaremos sobre o romance Apartamento 41, do escritor Nelson Luiz de Carvalho. A obra aborda, com sensibilidade, a “saída do armário” na vida de Leonardo Guimarães (personagem principal). Todavia, seus conflitos de identidade e aceitação de seus desejos, por vezes, são bosquejados por valores heteronormativos. Ao retirar a máscara da obediência, o protagonista lhe oferta, dentro das amarras de seu meio, um estilo de vida mais condizente com seus sentimentos e pensamentos. Suas escolhas rompem, até certo ponto, com estereótipos e reducionismos sociais. A partir dessa abordagem, veremos como determinados textos da literatura (de expressão) gay continuam presos a conceitos conservadores sobre o gênero, o sexo e a sexualidade, de modo a reproduzir crenças segregadoras.
Palavras-chave: Literatura , Homoafetividade, Dispositivos de poder.