No seu último livro, publicado postumamente, intitulado Estilo tardio, Edward Said discute acerca do que seria uma obra tardia, vista por ele como uma produção da maturidade que não é elaborada na tranquilidade de uma sabedoria reconhecida, de uma trajetória criativa consagrada, mas pela busca de uma forma de materialização de produção ainda não realizada. Na certeza da morte próxima, não há nesse produtor tardio uma postura de conciliação consigo mesmo e com sua obra, mas um instante experimental do estilo que se concretiza num tempo-limite. Ao invés de tentar proferir a última palavra, a consideração definitiva, o criador de uma obra tardia procura a expressão ainda não inventada, a que acredita só poder dizer nesse instante em que a consciência da morte altera a percepção a respeito do tempo e da obra. A obra tardia tem no paradoxo, na tensão e no contingente sua dinâmica e ela própria se constitui numa relação paradoxal com sua tradição artístico-cultural. Diante desse perfil de produção intelectual, a pergunta que se faz é a seguinte: o que a consciência do encontro com a morte pode promover de criação do novo, de questionamento da obra realizada e da obra por realizar? O objetivo deste trabalho é refletir como a noção de estilo tardio permite que se analisem criações artístico-intelectuais que, produzidas na iminência da morte, possuam dicções singulares no contexto de determinadas épocas e territórios culturais por seus perfis dissidentes e experimentais, estabelecendo uma relação conflituosa com as produções de arte e de pensamento intelectuais vigentes. Será colocada em destaque a produção intelectual de Edward Said e o que se poderia chamar de suas obras tardias, as escritas do autor elaboradas depois que, em 1991, ele descobriu que tinha leucemia, como Reflexões sobre o exílio (1998), Fora do lugar (1999), Paralelos e Paradoxos (2002), Humanismo e Crítica Democrática (2004), até a produção, inacabada, do seu livro de ensaios Estilo tardio (2006).