O trabalho em questão configura-se como uma análise crítico-reflexiva da imersão no campo do estágio para observação da prática docente sob o viés etnográfico, atividade concernente à disciplina de Estágio Supervisionado em Língua Portuguesa II, na UFPE. A experiência relatada ocorreu em uma turma de 9º ano EF de uma escola pública estadual, situada na Zona Oeste pernambucana. O objetivo dessa análise é buscar compreender como se efetiva o currículo na prática e refletir sobre o papel e a concepção do ensino de língua, a partir da problematização do uso do livro didático de Língua Portuguesa. Dessa forma, tomou-se como base o objetivo do currículo prescrito pelo material didático em contraposição à aplicação do currículo real por parte da professora regente. Ficou evidenciado ao longo da análise que o currículo real afastou-se bastante do currículo prescrito pelo livro, sendo que a proposta do material didático foi por vezes modificada e reduzida para a reprodução e a perpetuação de metodologias tradicionais, negligenciando alguns eixos da educação linguística (oralidade e produção textual) e concebendo leitura como a simples decodificação de signos linguísticos. Isso, por sua vez, permite inferir que há uma falha na formação inicial docente – e em sua formação continuada – no que diz respeito à compreensão da proposta didática desses materiais e a alguns saberes teóricos subjacentes a eles, de forma a habilitá-los a fazer a regulação dessas aprendizagens. Assim, a falha na compreensão global da proposta do livro reduziu este gênero a um suporte de textos e atividades sem conexões entre si, aplicadas para fomentar a instância do exercício como estratégia de manejo frente à inquietude e à indisciplina da turma. Por fim, pode-se dizer que o trabalho defende a necessidade de que o investimento não se concentre apenas na produção e distribuição de materiais didáticos, mas também que ocorra de forma mais efetiva na formação do professor, ao longo de sua graduação e de sua prática docente, para que ele compreenda melhor os recursos que dispõe e consiga, até mesmo, transcendê-los e complementá-los, conscientemente, quando necessário for. Para subsidiar teoricamente as questões apontadas e problematizadas no trabalho, fez-se necessária a recorrência a alguns autores. No que tange a questões de natureza curricular, o embasamento se deu a partir dos postulados de Arroyo (2007), Pacheco (2001) e Perrenoud (1995). Já para compreender as questões pertinentes ao domínio discursivo do livro didático de Língua Portuguesa, adotou-se as concepções teóricas defendidas por Bunzen e Rojo (2005) e Bunzen (2011).