A grande diversidade cultural da região nordeste do Brasil é derivada dos saberes de diferentes populações tradicionais, as quais apresentam uma história de conhecimentos e práticas relacionadas ao uso dos recursos naturais. No recorte desta pesquisa, destacamos as comunidades tradicionais quilombolas, que são grupos étnicos – predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana –, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias. O presente estudo tem como objetivo registrar e comparar o conhecimento etnobotânico das comunidades quilombolas Pêga e Arrojado e de comunidades não quilombolas, todas localizadas no município de Portalegre-RN. Para tanto, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com vinte informantes de cada localidade. Nas entrevistas foi abordado o uso das espécies vegetais em diferentes categorias de uso, a saber: medicinal, alimentação, madeireiro, forragem, místico/religioso e comercial. Para identificar as espécies mais importantes culturalmente foi empregada a técnica do valor de uso (VU) e para comparar os padrões de conhecimento das três comunidades foram utilizados os índices de diversidade de Simpson e Shannon-Wiener. Os 60 informantes indicaram o uso de 89 espécies, pertencentes a 45 famílias botânicas, entre todas as categorias de uso. As espécies cajueiro (Anacardium occidentale), jurema-preta (Mimosa tenuiflora) e marmeleiro (Croton sonderianus) apresentaram os maiores valores de uso, indicando sua importância cultural para as comunidades amostradas. Os altos valores do índice de Shannon-Wiener encontrados na comunidade Pêga (H’= 4,25), Arrojado (H’=4,15) e comunidade não quilombola (H’=4,11) são indicativos do seu grande conhecimento acerca da flora nativa e exótica. Já os valores do índice de Simpson encontrados foram de D=0,015, D=0,017 e D=0,018, para as comunidades Pêga, Arrojado e não quilombola, respectivamente, indicando baixa dominância das espécies conhecidas pelos informantes. A integração dos resultados demonstrou que o conhecimento das comunidades quilombolas sobre a flora é grande, porém não difere significativamente do conhecimento da comunidade não quilombola, o que provavelmente é resultado de um histórico intercâmbio cultural entre as referidas comunidades.