De acordo com a Psicanálise, o trauma é uma fixação psíquica do indivíduo numa situação de choque violento, de ruptura, onde a pessoa sobrevivente é marcada por um estado crônico de angústia que a torna incapaz de verbalizar essa experiência. Para Freud (1914), a única forma de superar essas memórias traumáticas é perlaborá-las através de um processo que ficou conhecido como a “cura pela fala”. Scholastique Mukasonga é uma escritora ruandesa que sobreviveu ao trauma das guerras, da violência e do genocídio étnico ocorrido em seu país nos anos 1990. Suas obras (Baratas, 2006; A mulher de pés descalços, 2008; e Nossa senhora do Nilo, 2012) são testemunho (SELIGMANN-SILVA, 1999; 2003) de um contexto de guerra que mistura ficção às memórias do país em que ela nasceu. Neste trabalho, investigamos como o processo de escrita de suas “memórias” são, não só uma maneira de Mukasonga abrir as suas mais profundas feridas e contar o inenarrável (HUA, 2006) de suas experiências-limite através da ficção literária, mas também como essas experiências individuais fazem parte de uma memória coletiva (HALBWACHS, 2006) que busca perpetuar as lembranças de todos que estavam fadados ao extermínio.