Propomos uma leitura do conto "O jantar", de Julián Fuks, enfocando as configurações do medo e da violência perpetrados por regimes ditatoriais como maldades banais. O conto narra a visita de um jovem brasileiro a uma velha tia que mora na Argentina, com o propósito de participar de uma reunião que deveria ser prazerosa a ambos: um jantar em família. No entanto, a trama vai se revelando como uma situação opressora e como real ameaça à liberdade de expressão e à própria vida. O senso comum apregoa que o medo seria fundamental para a sobrevivência, já que é um indicador de possíveis perigos. Em se tratado de violência, há que se insurgir contra, desconstruindo qualquer noção de legalidade ou legitimidade impostas por autoridades políticas "defensoras" do funcionamento adequado de diversos segmentos na máquina estatal. Objetivando enfatizar a maneira pela qual o autor mimetiza os percalços do combate que o protagonista enfrenta ao sentir-se imolado por uma lembrança dolorosa dos atos de barbárie impetrados pelo regime político de exceção que desestruturou sua família, recorremos ao pensamento de Bauman (2012), Arendt (2014) e Zizek (2014) para endossar a proposta do autor em atrelar a narrativa às grandes questões éticas, em uma associação que nos permite inquietações e reflexões, levando-nos ao reconhecimento de que o propósito da criação literária ultrapassa a mera fruição estética e a complacência passiva para construir-se como matéria de denúncia e protesto.