SIMULACRO E CONTEMPORANEIDADE NAS NARRATIVAS EMENDADAS DE PARTIDA DO AUDAZ NAVEGANTE E A IDADE DA TERRANo estudo da narrativa, a tensão entre os aspectos de verossimilhança e de simulacro é um elemento presente ao longo das discussões tanto no campo da teoria fílmica quanto no da teoria literária. A experiência do cinema como ilusão de movimento e de continuidade fez surgir o embate entre uma montagem que tornasse invisível a descontinuidade elementar do fazer cinematográfico e uma opção pela ostentação desta descontinuidade. No que tange às questões da teoria literária, as primeiras tensões permeiam as discussões filosóficas de Platão e Aristóteles – desde a expulsão dos poetas de uma república ideal, dado o seu caráter subversivo, à reintegração aristotélica, que destaca os benefícios do encadeamento lógico e da representação como verossimilhança para a análise do real. A partir da modernidade, a adoção de estratégias que privilegiam a ênfase na potência do simulacro vai produzir uma mudança nessa relação entre narrativa e mundo, pois novos formatos de real passam a ser considerados, problematizando a perspectiva de representação análoga a um real contínuo e definido. O objetivo deste trabalho é analisar as repercussões narrativas de duas obras representativas destas espécies de rupturas, desta ênfase no simulacro: o conto “Partida do audaz navegante”, integrante do livro Primeiras estórias do escritor mineiro João Guimarães Rosa e o filme A idade da terra do cineasta baiano Glauber Rocha. Buscamos verificar como essas duas produções, instauradas no contexto cultural da modernidade, apresentam narrativas de ênfase no simulacro, cujas estratégias ultrapassam um mero exercício estético, uma mera ruptura formalista, para ajudar a lançar as questões desestabilizadoras das noções unívocas de tempo, espaço e identidade, inquietações tão presentes na discussão da contemporaneidade, ou modernidade tardia, como preferem alguns teóricos, ou pós-modernidade, na classificação de outros.