A partir das contribuições da teorização foucaultiana e queer, este artigo traz algumas problematizações acerca da escrita sobre diferença sexual, desde o discurso que a formula como sexualidade periférica, transitando pelo processo de homogeneização, de reinscrição da diferença na polarização fundada em díades e de seu silenciamento. Destaca ainda o legado do colonialismo em tal produção, dando ênfase à verdade produzida historicamente sobre o corpo e o sexo, inclusive pelo discurso científico. Fala do corpo trans e de seu potencial disruptivo ao colocar em labirinto noções tradicionais de masculino e feminino, tratando-o como um intercessor, cuja experiência traz à cena uma contra-imagem capaz de subverter normatividades por carregar em si uma verdade explosiva e selvagem, cínica, e de promover outros ensaios de existir. Evidencia a experiência trans como uma existência ambígua e fronteiriça, com possibilidade de transfiguração pela mescla, recriando sua singularidade no próprio corpo. É uma ferramenta capaz de constituir uma micropolítica de resistência, provocando-nos a pensar a existência como perspectiva-em-devir. Por fim, fala da agonística dessa vivência no entre, de modo que sua metamorfose assume um valor coletivo, considerando que todos os corpos são constrangidos a enquadramentos e idealizações fabricados. Trata-se de um corpo fronteiriço, que em sua agonística desnuda territorialidades forçadas, fazendo calar os discursos que sobre ele se debruçam por ser ele mesmo uma linguagem que fala antes de qualquer palavra, contribuindo assim para a produção de um outro de nós mesmos.