No Brasil, a linha entre o sagrado e o profano, sobretudo no Carnaval, sempre foi muito tênue. Fomos forjados, como muito bem disse Darcy Ribeiro (2008. p. 140), “da confluência do entrechoque, do caldeamento do invasor português com índios silvícolas e com negros africanos”. E continua, “somos uma cultura sincrética, um povo novo que, apesar de fruto da fusão de matrizes diferenciadas, se comporta como uma só gente”. As Relações sincréticas fizeram, e ainda fazem, parte da nossa própria construção de sociedade, da nossa identidade enquanto pertencentes a um grupo comum, com particularidades que nos distinguem enquanto brasileiros. Herdamos, entre tantas heranças, um conjunto de práticas religiosas que se misturam e que nesta mistura surgem modelos e formatos, redesenhados e ressignificados pela relação muito estreita entre o fiel (homens e mulheres religiosos) e aquilo que se constitui como sagrado. O presente trabalho é parte da pesquisa, em curso, de Pós-graduação desenvolvida na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Com ela, objetivamos debater as imbricações entre a arte, o sagrado e as performatividades das sexualidades nas alegorias e fantasias nas escolas de Samba do Rio de Janeiro. Para tanto, recorremos as narrativas produzidas por meio da imprensa e profissionais do Carnaval (carnavalescos, direção de carnaval, escultores, ferreiros, desenhistas, arquitetos, entre outros). Importa notar no contexto do Carnaval carioca, que apesar dos preconceitos religiosos aos ritos pagãos ou performatividades sexuais dissidentes, no Sambódromo a fé judaico-cristã é capaz de conviver harmoniosamente com os ritos afro-brasileiros expressos em alegorias e fantasias que auxiliam na construção de performatividades sexuais abjetas à normalidade. As danças e sensualidades fazem parte desse grande espetáculo onde elementos característicos de afirmação de identidade e dignidade humana podem ali ser expressos nos ritmos e sonoridade das baterias.