O escritor português Eça de Queirós (1945-1900) não foi um cozinheiro de fato, mas deixou sua marca na cozinha portuguesa. Em sua obra, jantares, almoços e cafés servem à representação crítica de vários aspectos (hábitos, sexualidade, moral) da sociedade portuguesa do século XIX. Neste artigo, analisaremos, no romance O Primo Basílio, a construção das personagens femininas Juliana e Luísa, relacionando-as à comida e à cozinha, aos modelos de constituição do gênero feminino e às possibilidades e aos limites históricos de ação da mulher na sociedade lisboeta do século XIX. Procuraremos evidenciar que ─ na medida em que as personagens afirmam ou negam padrões de representação e ação do feminino ─ as posições de poder se alternam, que a gastronomia é uma relevante chave interpretativa da obra de Eça de Queirós, e que as cozinheiras têm importante papel na construção da narrativa e na crítica ácida dos modelos de família patriarcal do século XIX.