Nos flancos da literatura contemporânea, irrompem representações que reverberam múltiplas faces do feminino, desde imagens ingênuas e pueris a retratos humanos marcados pela ardilosidade, cujos corpos engendram as mais simples e excessivas performances, em prol de obter aquilo que ambicionam. Este é o caso da personagem Roxanne Scarbrough, do romance Southern Comforts, escrito pela canadense Joann Ross. Deparamo-nos com uma protagonista, de feições anti-heróicas, que mobiliza seu corpo como objeto de sedução, com o qual usurpa do masculino prestígio e ascensão social. Todavia, esse comportamento, eticamente ambíguo, torna-a uma transgressora, quando não se submete, em dadas dimensões da narrativa, aos protocolos do patriarcado. Além disso, tal personagem objetifica os homens a sua volta, a fim de que deles retirem o que, por meios outros, não conseguiria, levando-os, em seu nome, a transgredirem as leis civilizatórias da sociedade. Nossa pesquisa, numa interlocução entre os estudos psicanalíticos de base freudiana e as teorizações sócio-filosóficas de BATAILLE (1987), pretende analisar, na narrativa em foco, a ambivalência que recai sobre a personagem principal, dotando-a, ao mesmo tempo, de vícios e prerrogativas. Estamos diante de uma heroína às avessas, cujos desejos transgridem a norma e põe, em xeque, as fronteiras da moralidade.