A RELAÇÃO ENTRE HISTÓRIA E LITERATURA MOSTRA-SE COMPLEXA NO QUE DIZ RESPEITO AO PROTAGONISMO DAS MULHERES NA MAIORIA DOS CONTEXTOS DE PRODUÇÃO. PARTINDO DISTO, O PRESENTE TRABALHO TEM COMO OBJETIVO ANALISAR DE QUE FORMA DÃO-SE A IMPORTÂNCIA E A INFLUÊNCIA DA LITERATURA MÍSTICA MEDIEVAL DE AUTORIA FEMININA, MAIS ESPECIFICAMENTE DURANTE A BAIXA IDADE MÉDIA, NA CONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA DAS MULHERES. SENDO SUJEITOS SOCIAIS, AS MULHERES COMPARTILHAM PONTOS EM COMUM ACERCA DE SUAS EXPERIÊNCIAS, TENDO A PALAVRA COMO INSTRUMENTO PRINCIPAL DE PROPAGAÇÃO DO DISCURSO SUBVERSIVO FRENTE AO SISTEMA PATRIARCAL IMPOSTO NOS SÉCULOS DE DIFUSÃO DA PALAVRA ESCRITA. NESTA PESQUISA, TEM-SE COMO FOCO A PALAVRA DAS MULHERES MÍSTICAS MEDIEVAIS, TAIS COMO MARGUERITE PORETE (?-1310), HADEWIJCH D’ANVERS (1190-1240), MATILDE DE MAGDEBURGO (1207-1294), BEATRIZ DE NAZARÉ (?-1268), DENTRE OUTRAS IMERSAS NA MESMA TRADIÇÃO. NESTE CAMINHO, E SEGUINDO O PONTO DE VISTA DE RÉGNIER-BOHLER (1990), CONSIDERA-SE QUE A PALAVRA IMPLICA COMPROMISSOS SOCIAIS, CONSENSOS, PRÁTICAS E RELAÇÕES COM O SAGRADO, SENDO NECESSÁRIO, PORTANTO, ATRIBUIR ÀS MULHERES MEDIEVAIS A RELAÇÃO ATIVA COM A MESMA E, PARTINDO DE SEUS ESCRITOS, CONSIDERÁ-LAS ELEMENTOS QUE PASSAM A TRANSGREDIR OS LIMITES DO ÂMBITO RELIGIOSO, QUE FOI BASE DA SOCIEDADE MEDIEVAL. DESTA FORMA, COMPREENDE-SE QUE, APESAR DE COMPOREM DISCURSOS DISTINTOS, A LITERATURA E A HISTÓRIA CONSIDERAM AS EXPERIÊNCIAS DOS SUJEITOS EM RELAÇÃO AO SEU CONTEXTO, SERVINDO COMO PONTO DE PARTIDA PARA O ENTENDIMENTO E A MODIFICAÇÃO DAS REALIDADES SOCIAIS. NO CASO DAS MULHERES, DEFENDE-SE QUE A AUTORIA SEMPRE FOI UM PRIVILÉGIO DO PATRIARCADO, QUE, SEGUNDO O ESTUDO DE LERNER (2019), PERSISTE COM A COOPERAÇÃO DAS MULHERES POR MEIO DA DOUTRINAÇÃO E DE SUA NEGAÇÃO SOBRE A PRÓPRIA HISTÓRIA, AFETANDO NEGATIVAMENTE NA FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA FEMINISTA E, CONSEQUENTEMENTE, NA CONCRETIZAÇÃO DAS NARRATIVAS QUE CARREGAM REALIDADES COMUNS AOS GRUPOS FEMININOS E TORNANDO SUA ESCRITA COMPLETAMENTE SUBVERSIVA. ESTA SUBVERSÃO PAUTA-SE NAS ESCOLHAS DAS PRÓPRIAS MULHERES NA CONSTRUÇÃO DE SUAS PRODUÇÕES, QUE COMPREENDEM: A) A INSERÇÃO EM TERRENOS DE DOMÍNIO MASCULINO; B) A REIVINDICAÇÃO EM TORNO DAS HIERARQUIAS SOCIAIS ATRAVÉS DAS INTENÇÕES DISCURSIVAS NAS TRADIÇÕES LÍRICAS DO PERÍODO; C) O CARÁTER AUTOBIOGRÁFICO DAS EXPERIÊNCIAS MÍSTICAS, AO MESMO TEMPO QUE FICCIONAL, NO CASO DE MARGUERITE PORETE; D) A SOBREPOSIÇÃO DO PENSAR FEMININO EM RELAÇÃO À MERA REPRESENTAÇÃO; E) O DESENVOLVIMENTO DE UMA LINGUAGEM ESPECIFICAMENTE FEMININA QUE SE DIRIGE AO DIVINO; F) A RECONCEITUALIZAÇÃO DO SAGRADO; E G) O FLORESCIMENTO DE UMA CRÍTICA FEMINISTA SOBRE OS TEXTOS SAGRADOS. SENDO ASSIM, PARTE-SE DA CRÍTICA FEMINISTA, POR SCHMIDT (2017), ROVERE (2019), GILBERT E GUBAR (2017); DA HISTÓRIA DAS MULHERES, POR BOLTON (1983), PERROT E DUBY (1990), POWER (1979), BROCHADO E DEPLAGNE (2018) E LERNER (1993; 2019); E DA MÍSTICA FEMININA, POR NEWMAN (1995), GARÍ E CIRLOT (2008), NOGUEIRA (2018) E RÉGNIER-BOHLER (1990).