O presente trabalho analisa criticamente discursos da doutrina penal brasileira, buscando verificar de que modo estes revelariam práticas de violência simbólica na maneira como representam a noção de gênero em suas considerações sobre o homicídio privilegiado. O estudo tem como corpus dois manuais de Direito Penal largamente publicados no país: o de Fernando Capez e o da autoria dupla de Julio Fabrini Mirabete e Renato Fabrini, enquadrando-se como objetos de estudo seus exemplos ilustrativos de possíveis casos concretos para a explanação da referida matéria. O referencial teórico-metodológico utilizado é a Análise Crítica do Discurso na linha desenvolvida por Norman Fairclough. Como ponto de partida para a análise e discussão, tem-se a sua noção de “Modelo de análise tridimensional do discurso”, além do pensamento teórico de um ícone fundamental nos estudos de gênero, poder e violência simbólica: Bourdieu. Defende-se que tais discursos reproduzem estereótipos de gênero, de modo que os resultados obtidos nas análises propostas confirmam que a doutrina nas estratégias textuais que aciona acaba perpetuando violência simbólica de gênero no domínio das práticas sociais, comprometendo, assim, seu dever de tutelar bens jurídicos, bem como a eficácia da garantia da isonomia dos indivíduos perante o Direito.