As nuances e gradações, muitas vezes contraditórias, que a sexualidade humana dispõe, despertaram o interesse de diversas áreas do conhecimento ao longo da história. Porém, é a partir da segunda metade do séc. XIX que podemos constatar uma confluência expressiva de estudos sobre o sexo. Trata-se do alvorecer da sexologia, época na qual a medicina, influenciada por ideais higienistas, numa lógica patologizante, toma para si o desígnio de descrever as práticas sexuais, classificando-as, arbitrariamente, em categorias “saudáveis” ou “perversas”. Um dos seus preceptores mais notórios foi o psiquiatra alemão Krafft-Ebing (1840 – 1902) que, inspirado pela obra ficcional do escritor austríaco Sacher-Masoch (1836 – 1895), cunhou pela primeira vez o termo “masoquismo” para designar um comportamento sexual que ele considerava anormal. Desde então, o quadro de amor e ódio que Sacher-Masoch desenhou, de maneira tão magistral, serviu de inspiração para muitos artistas que procuraram (re)criar, à sua maneira, as congruências da performance masoquista. Eis o caso, por exemplo, de Venus in Furs (1994), adaptação cinematográfica da obra prima de Sacher-Masoch, Venus in Pelz, dirigida por Maartje Seyferth e Victor Nieuwenhuijs. O longa-metragem – que elegemos como objeto de estudo – recupera a conturbada relação amorosa dos protagonistas da narrativa original, Severin von Kusiemski e Wanda von Dunajew, situando-os não no séc. XIX, mas, no contemporâneo. Para os fins deste trabalho, orientados, sempre, pelo aparato teórico da psicanálise (pós)freudiana, debruçar-nos-emos sob o teatro erótico, meticulosamente encenado por Severin e Wanda, com vistas a demarcar a lógica infausta que rege a vida pulsional destes.