Resumo Este texto resulta de pesquisa sobre o Ensino Médio, tem ênfase nas tensões político-sociais e econômica contidas nas definições das políticas educacionais. Trata-se de um estudo bibliográfico e documental a partir das seguintes fontes: Projeto de Lei nº 6840/2013, Medida Provisória nº 746/2016, Lei nº 13.415/2017, artigos e livros publicados por autores que se dedicam ao estudo sobre políticas de ensino médio. Objetiva discutir as determinações históricas e explicitar as implicações pedagógicas da reforma do ensino médio. Para tanto, o raciocínio segue uma lógica de articulações e relações entre documentos, qual seja: a Lei 13.415/2017 tem estreita correspondência com o Projeto de Lei nº 6840/2013, deriva da Medida Provisória nº 746/2016, cujo conteúdo depende do estabelecimento da Base Nacional Curricular (BNCC), ainda não aprovada. Outra referência importante, a base fundamental do que está sendo proposto para o ensino médio atualmente se articula, em muito, às recomendações internacionais da reforma educacional dos anos 1990. Fonseca (1998), Deitos (2001), Shiroma, Moraes e Evangelista (2011) identificam como a reforma educacional dos anos 1990 fora influenciada pelas proposições e condicionantes de agências e organizações internacionais: Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e Banco Mundial. Num contexto de redefinição do papel do Estado e num movimento maior de mudanças na esfera da produção e do mercado, no âmbito de crise do capital, no qual o projeto hegemônico passou a definir um novo papel à educação, mais adaptada as demandas de mercado e do trabalho, pautado nas ideias de flexibilização e empregabilidade. Nesse aspecto, concorda-se com Cunha (2017), esse autor em uma análise sobre reforma do ensino médio identifica nela um atalho para o passado, no qual a medida reformatória em curso "não se trata de invenção de ministro improvisado" mas de uma reedição da política educacional "[...] do período Fernando Henrique Cardoso, quando Maria Helena Guimarães de Castro ocupou a presidência do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais durante toda sua gestão, após dirigir secretarias nos governos paulistas de José Serra e Geraldo Alkmin" (CUNHA, 2017, p. 379). A política de ensino médio atual deriva do controverso Projeto de Lei nº 6840/2013, resultante dos debates provenientes da Comissão Especial para Reformulação do Ensino Médio - CEENSI. A novidade está na interrupção do debate pelo estabelecimento da Medida Provisória nº 746/2016, cujo propósito parece ofuscar o avançar das discussões e se apresentar como única proposta em tela. Os argumentos para a instituição da Medida Provisória pautaram-se no aspecto da urgência de mudanças curriculares para corrigir um conjunto de problemas do ensino médio: não se constituir atrativo aos jovens; não se conectar aos seus projetos de vida; o ensino não se alinhar às demandas do processo de desenvolvimento do país; apresentar baixos resultados de proficiência e alto índice de abandono. Os mecanismos para solucionar os problemas identificados passam principalmente pela alteração curricular, a ideia é que o currículo seja mais flexível e adaptado aos "projetos de vida" dos jovens. Indica-se também o resgate de conceitos provenientes do Relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, coordenada por Jacques Delors, apoiados nos quatro pilares: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. A efetivação da Lei 13. 415/2017 depende ainda da aprovação da BNCC do ensino médio, vários são os questionamentos em relação a essa base, destaca-se o desvanecimento dos campos disciplinares nas chamadas áreas de conhecimento, ao estabelecer que "A Base Nacional Comum Curricular referente ao Ensino Médio incluirá obrigatoriamente estudos e práticas de Educação Física, Arte, Sociologia e Filosofia" (BRASIL, 2016). O que significam estudos e práticas? Quem vai definir? Entende-se que a importância desse estudo se firma na possibilidade de identificar que não existe neutralidade nas propostas que comumente surgem em tempos de crise do capital, é preciso identificar quais as tensões e conflitos de interesses em relação aos objetivos e funções atribuídas à escola que circulam nos documentos que reformam o ensino médio, visto que o proposto se articula com um conjunto de coisas: definem os componentes curriculares que são obrigatórios, constitui referência para Política Nacional de Avaliação, também para a política nacional de materiais e tecnologias educacionais e consiste balizadora das políticas de formação inicial e continuada de docentes. De forma que as consequências pedagógicas à proposta em curso apontam para: a) um esvaziamento do conhecimento escolar, em especial às escolas públicas, em dois polos: primeiro, pela conformação de disciplinas aos imprecisos estudos e práticas e, em segundo, pela limitação de proposição de itinerários limitados à disponibilidade orçamentária e recursos já bastante precários; b) a padronização curricular afinada às demandas mais imediatas do mercado e para o mercado (livros e conjuntos pedagógicos); c) um forte acento para a prática e com desvalorização do conhecimento teórico, cuja consequência é a possibilidade de baratear e aligeirar a formação docente. Talvez isso explique retirada do art. 62 da LDB, que definia a "[...] exigência de que apenas em universidades e institutos superiores de educação se faça a formação de docentes em nível superior para atuar na educação básica" (BRASIL, 2017). Entende-se que a compreensão da política educacional passa pelo entendimento da sociedade capitalista no momento atual, contexto de crise, cujas raízes estão na organização do modo de acumulação e especulação pautados na exploração do trabalho. Nesse aspecto, as análises de Gramsci (1978), sobre a concepção democrática e dialética das relações entre o intelectual e a sociedade, permite pensar sobre a educação brasileira, na qual a reforma atual concorre para perpetuar e acentuar as diferenças sociais. Conclui-se que há um insistente discurso que marca a necessidade de adequar a educação às necessidades da economia, como se fosse essa a sua eterna e natural vocação. Muito do que hoje é apresentado como novo no campo da educação foi transportado de um passado recente, num esforço de conservação dos interesses do capital. Palavras-chave: ensino médio, Lei nº 13.415/2017, BNCC, docência. Referências BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. (Lei nº 9.394/96). Disponível em: . Acesso em: 15 mar. 2016. BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.415, de 2017. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13415.htm. Acessos em abr. 2017. CUNHA, Luiz Antônio. ENSINO MÉDIO: ATALHO PARA O PASSADO. Educ. Soc., Campinas, v. 38, n. 139, p. 373-384, Jun. 2017. DEITOS, Roberto Antonio. Ensino médio e profissional e seus vínculos com o BID/BIRD: os motivos financeiros e as razões ideológicas da política educacional. Cascavel, PR: EDUNIOESTE, 2001. FONSECA, Marília. O Banco Mundial como referência para a justiça social no terceiro mundo: evidências do caso brasileiro. Revista da Faculdade da Educação, São Paulo, v. 24, n.1, p. 37-69, jan./jun. 1998. GRAMSCI, A. "A organização da escola e da cultura", in: GRAMSCI, A. Os Intelectuais e a Organização da Cultura. RJ: Civilização Brasileira, 1978. SHIROMA, Eneida Oto; MORAES, Maria Célia Marcondes e EVANGELISTA, Olinda. Política Educacional. 4. Ed Rio de janeiro: Lamparina, 2011.