O regime ditatorial civil-militar que se desenvolveu em Portugal, conhecido como Estado Novo (1933-1974), aprofundou e estreitou as suas rela??es com a Igreja, integrando o discurso ideol?gico crist?o em rela??o ? mulher ao discurso institucional pol?tico. O imagin?rio crist?o em rela??o ? inferioridade feminina, ? desconfian?a em rela??o ? mulher e a sua poss?vel ?reden??o? enquanto m?e, ? figura de Maria Mater, foi desenvolvido por meio de um discurso pol?tico institucional que relega a mulher ao ?mbito privado da casa, aos cuidados da fam?lia, marido e filhos. Um discurso que silencia e tolhe as liberdades conquistadas no conturbado per?odo anterior, que ficou conhecido como a I Rep?blica (1910-1926).
Pode-se examinar dentro destes regimes autorit?rios que o discurso e o sil?ncio sobre a sexualidade se organizam dentro do que ? permitido ou n?o aos dois g?neros, masculino e feminino. Ou seja, ?como s?o distribu?dos os que podem e os que n?o podem falar, que tipo de discurso ? autorizado ou que forma de discri??o ? exigida a uns e outros.? (FOUCAULT, p. 31). Al?m disso, esses discursos s?o organizados dentro de uma estrutura pol?tica: servem a tal estrutura, delimitam o lugar, as fun??es e o comportamento esperado de cada um dos g?neros na organiza??o social, de modo a permitir o funcionamento de determinada sociedade dentro das rela??es de poder
Desta forma, o presente trabalho pretende analisar de que maneira as escritoras e feministas portuguesas Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa constroem o discurso de resist?ncia feminista ao discurso de poder do Estado Novo que reprime os sujeito feminino e sua sexualidade, na pol?mica obra Novas Cartas Portuguesas (1972), que foi apreendida tr?s dias ap?s o lan?amento e que gerou o processo mais conhecido (e talvez o maior) movido pelo Estado Novo, e que mobilizou desde imprensa a grupos feministas internacional e veio a se tornar a primeira grande causa feminista internacional, em 1973. Para isso, abordaremos
a intertextualidade que as Tr?s Marias estabeleceram com o texto cl?ssico Cartas Portuguesas, atribu?do a Mariana Alcoforado, j? como uma forma de subvers?o liter?ria e pol?tica no que diz respeito ? voz feminina e tamb?m discutiremos o processo enfrentado pelas autoras de Novas Cartas pelos ?rg?os de repress?o do Estado Novo Portugu?s, sob o vi?s da teoria do poder de Michel Foucault.